3.27.2006

O PALOCCI


Pois é... lá se foi o Palocci.

E, pior, foi-se de uma maneira melancólica, que bem ilustra a política do governo petista: uma política de resultados. Como se, no governo, o PT ainda vivesse a época do sindicalismo.

Em síntese: já que a economia está bem, o Palocci não é mais necessário. Então... dispense-se o Palocci, para que as acusações sobre ele não afetem o governo.

No meu pobre entender, isto é a mesma coisa que endossar as acusações ao ex-ministro; admitir que ele era culpado, mas não podia sair porque era útil ao ao governo.

Mesmo assim, sobrevivem duas perguntas incômodas. A primeira: será que ele era, mesmo, culpado? E a segunda, pior ainda: se o era, até que ponto essa culpa foi individual, ou ocorreu a serviço (e a mando) do próprio partido?

São perguntas que, provavelmente, jamais serão respondidas; a cortina do tablado se encarregará de encobrir as verdades.

De toda forma, lá se foi o Palocci.

I Pagliacci continuamos...



Na imagem, do Google, um flagrante recente, que bem ilustra a lealdade do PT

3.26.2006

I PAGLIACCI


Celso Daniel e Toninho de Campinas; mortos. E a cortina do tablado permanece descida, para que não se descubram os mandantes dos crimes.

O Supremo Tribunal Federal impede que se quebrem os sigilos bancários e telefônicos de amigos de Lula, documentos considerados de grande importância para a CPI que investiga o mensalão. Aqui, a mão que desceu a cortina pertence ao chefe da maior instância judiciária do país.

Enquanto isto, no centro do picadeiro, o caseiro que denunciou Antonio Palocci tem o seu sigilo bancário quebrado e exposto na mídia. Sem qualquer autorização judicial. A cortina volta a cobrir o tablado, ocultando os responsáveis pela indiscrição criminosa.

Relaxada a vigilância da mídia e protegidas pelo indecente “voto secreto”, as excelências continuam a absolver os seus pares, apesar das culpas mais do que provadas. Mais uma vez, a cortina do tablado funciona e oculta os deputados que votam pela absolvição dos corruptos descobertos.

Um pequeno deslize: a excelência Ângela Guadagnin desce do tablado e dança no picadeiro, perdão, no plenário da Câmara, festejando a absolvição de mais um deputado que embolsou dinheiro do povo, via Marcos Valério; faz-me lembrar aqueles pequenos circos mambembes, que tinham como atração as rumbeiras.

Esta rumbeira não tem o corpo bem delineado daquelas de outrora. Mas a rechonchuda deputada, ao comemorar sem nenhum pudor a mais recente fornada, descobriu um local adequado para a sua exibição: a pizzaria do Congresso faz parte deste grande circo chamado Brasil.

Em junho, tem Copa do Mundo; vamos todos esquecer o quanto somos roubados, torcendo pela nossa gloriosa seleção. Vamos esquecer os escândalos do Bolsa Escola, do Fome Zero (à direita, neste caso), do mensalão, do surubão e muitos outros. Os nossos olhos estarão presos aos malabaristas da bola, em destaque no picadeiro.

Mas, convenhamos o hexa é uma conquista inédita; muito mais importante do que os probleminhas bestas do dia-a-dia, como saúde, educação, segurança pública, geração de emprego e outras bobagens. Quem precisa de nada disto, se a seleção for campeã?

Em outubro, depois das emoções da Copa, teremos a festa da democracia; aquela a que somos OBRIGADOS a comparecer, para exercer o nosso DIREITO de votar. Pelos próximos anos, os eleitos nesta festa manejarão as cortinas; e dirigirão o grande espetáculo do circo Brasil.

No qual, infelizmente, nós somos os palhaços e pagamos os ingressos!



Imagem colhida na Internet, banco de imagens do Google

3.21.2006

UMA DECISÃO HEDIONDA


Eu já havia visto a notícia na TV, mas não pensei que o absurdo fosse adiante. Agora, segundo o Bombástico de domingo passado, a coisa se complicou.

Resumindo: um pastor (que, pelo visto, usa mais o cajado que a Bíblia), condenado por abusar de três meninas, recorreu ao STF e conseguiu a redução da pena: vai cumprir o restante em regime semi-aberto, ou seja, fica livre durante o dia e só volta à prisão para dormir.

Mais meninas serão estupradas, sem dúvida. Mas não pára por aí: com base nessa decisão, alguns milhares de condenados por “crimes hediondos” também estarão de volta às ruas em breve. Inclusive o médico que dopou e estuprou 14 meninos, em seu próprio consultório, sem direito a rancho, parquinho ou zoológico.

Ora, façam-me o favor! De que adianta, então, a classificação de “crime hediondo”? Não passa de um jogo de palavras... como aquele que transforma o ESTUPRO em “atentado violento ao pudor”. Dito assim, não parece uma coisa bem mais suave? Mas só sabe quanto dói um estupro quem já o sofreu; nós, que graças a Deus fomos poupados, apenas podemos imaginar.

Atentado violento ao pudor é o cacete! Ou melhor: é uma decisão idiota dessas, vindo do mais elevado tribunal do país! O mesmo tribunal, aliás, que tem impedido a quebra de sigilos bancários, ou a liberação de depoimentos, acobertando a corrupção; que, se não me falha a memória, é outro dos crimes classificados como “hediondos”.

Há poucas coisas em que sou radical, mas esta é uma delas. Posso entender que alguém roube, levado pela fome; entendo até que alguém mate, em um momento de raiva ou desespero. Mas não vejo qualquer justificativa para o estupro, que atinge uma vítima inocente e deixa seqüelas para o resto da vida.

Pior, ainda, quando é um estuprador em série, como esse pastor ou esse médico, e outros que serão beneficiados pela condescendência dos meritíssimos; a grande prejudicada, como sempre, é a sociedade. Somos nós, que criamos nossos filhos e filhas com todo carinho, e agora os vemos expostos a esses criminosos liberados pelos juízes.

E não me venham dizer que é doença. Talvez até seja; mas, se for, com certeza é o caso de uma bela eutanásia. Permitir que esses indivíduos vivam na comunidade, é como dizer que o lobo, por também ser animal, tem o direito de permanecer entre as ovelhas.

Por mim, um cara desses não seria nem preso; seria morto, mesmo, na hora. É melhor que o governo gaste o nosso dinheiro alimentando os animais, nos zoológicos, do que sustentando essas bestas humanas.

Mas, se eles tiverem que viver, que ao menos vivam segregados, na cadeia, disputando os próprios rabos; há nisto uma espécie de justiça. O estupro é mesmo um crime hediondo.

Quase tão hediondo quanto uma decisão desse tipo!

3.14.2006

O TRIBUNAL DAS RAPOSAS


Leio, no Mundo Símio, mais um belo artigo de Dom Gustavo, comentando a absolvição do Professor Luizinho pelos seus colegas deputados, apesar de estar mais do que provado que a didática excelência recebeu uma grana do Marcos Valério.

A indignação do nobre amigo é mais do que justa, e a ela me associo inteiramente; quanto mais que a defesa do ilustre parlamentar careceu de qualquer fundamento ou lógica, mais parecendo o refrão do nosso atual (e provavelmente futuro) Presidente Lula: “Não vi, não sei”.

A indignação é justa, repito; mesmo porque o dinheiro que o governo distribuiu, com tanta liberalidade, saiu do nosso bolso. Mas preciso dizer que estas absolvições não são nenhuma novidade; eu já havia cantado esta pedra aqui no blog, desde o ano passado.

A lógica é simples: nenhum tribunal de raposas vai condenar aquela que foi apanhada saindo do galinheiro; até por uma questão de autopreservação. A não ser, é claro, que o fazendeiro esteja de arma engatilhada e olho fixo nos espertos juízes.

Explico: quando o mensalão e o surubão estouraram, tornaram-se pratos favoritos da mídia, com cobertura diária e detalhada. Foi aquela fase em que as sessões das CPIs eram televisionadas e atingiam picos de audiência, com cada parlamentar se esforçando mais do que os outros, para mostrar decência e severidade com os acusados.

Foi a fase da caça às bruxas. Naquele período, quem foi apanhado dançou; inclusive o antes todo-poderoso Zé Dirceu. Escreveu-se mais uma épica página da História do Brasil, com dinheiro em cuecas, grana sagrada viajando de avião, etc. e tal. Foi quando se descobriu que no Brasil circula mais dinheiro pelos ares, do que nas transferências bancárias. Cubano, inclusive.

Mas, depois, veio o recesso parlamentar. A mídia mudou o foco dos holofotes e a opinião pública se desviou do assunto; os trabalhos nas CPIs deixaram de render votos. O próprio Lula assinou alguns pacotes eleitoreiros e tornou a subir nas pesquisas. Tudo voltou a ser como dantes, no quartel de Abrantes.

Sem vigilância, as excelências sentem-se à vontade para absolver os seus pares. Atrevo-me, mesmo, a dizer que daqui pra frente só seria condenado o parlamentar que tivesse assinado um recibo, nos seguintes termos: “Recebi, de Marcos Valério, a quantia acima mencionada, pelo mensalão do mês tal”; e, mesmo assim, se não contestasse a assinatura.

Assim, as absolvições não me surpreendem. Isto é Brasil. A terra da Mãe Joana. O lugar onde se pára um avião na pista e se tiram dois passageiros, para que um general e a esposa possam embarcar; onde o exército precisa invadir favelas, para recuperar armas roubadas dos quartéis; onde baderneiros invadem fazendas de cidadãos, com o beneplácito do governo. Onde os deputados trepam e a gente paga.

Já nem sei mais se o mensalão acabou mesmo. Mas, confesso, espero que o surubão ainda continue. Se as excelências tiverem putas pra comer de graça, talvez aliviem um pouco os nossos rabos...

3.07.2006

O GENERAL E OUTROS MALAS


Vejo, no noticiário, que o Exército ocupou nove favelas do Rio, em busca de armas roubadas pelos traficantes. Aplaudo; afinal de contas, se o crime organizado não aprender que tem que respeitar pelas menos algumas das nossas instituições, em breve seremos uma nova Colômbia.

Aliás, acho que esta medida deveria ser bem mais durável. Se o Garotinho não tá resolvendo o problema, tem que se botar um homem pra resolver. Pelo menos, esta lógica me parece elementar.

Aí, quando estou pra parabenizar o glorioso Exército Nacional, vejo que um general fez parar um jato lotado, durante a decolagem, e dois passageiros foram retirados do vôo, para que o estrelado e sua digníssima esposa pudessem embarcar.


Lances como este, nos remetem a uma das mais perenes instituições nacionais: o tradicional “Sabe com quem está falando?”; que, por sua vez, nos remete à nossa condição de terceiro mundo.

Somos um país onde o povo não tem nenhum direito, a não ser o de levantar o traseiro, como bem frisou o ilustríssimo Lula Lelé; que, é lógico, apenas ressaltou este fato depois de ser tornar Presidente da República. Duvido que assim falasse, enquanto era um simples torneiro mecânico.

É a questão da “otoridade”, intrínseca no brasileiro. Digo “otoridade”, porque a autoridade não precisa se impor pela força, ou pelo poder; impõe-se pela lógica e pelo bom senso, que lhe conferem a dignidade necessária.

Não acho que o incidente vá nos jogar de novo numa ditadura militar. Mesmo porque os militares não têm mais interesse; já descobriram que é bem mais cômodo ficar nos quartéis, impondo prerrogativas pela força, enquanto civis fingem tomar conta desta bagunça e vão enchendo os próprios bolsos.

Assim, o fato não é perigoso para as nossas “instituições democráticas”; apenas comprova, mais uma vez, que as ditas cujas não existem, a não ser na boca de parlamentares, que defendem “verticalização de partidos”, “sigilo bancário” e outras mumunhas úteis aos seus interesses. Cada um puxa o papel higiênico para a sua própria bunda.

Que democracia existe em um país, onde alguém é forçado a desembarcar de um avião para ceder lugar a uma “otoridade”?

Mas, como já existem otoridades de sobra neste país, eu apenas espero que o exército resolva definitivamente o problema das favelas; e faça isto por todo o Brasil.

Já é bastante ruim, quando você reclama do cara que furou a fila em sua frente e ele responde: “Sabe cum quem tá falando? Eu sô sordado da Puliça, porra!”.

Vai ser pior ainda, quando o cara se achar no direito de responder: “Fica na tua, que eu sou traficante, mermão!”...

3.01.2006

ATAQUE DE NOSTALGIA



OK, talvez seja apenas um saudosismo besta. A verdade é que, aos 58 anos, eu provavelmente não sairia de casa para ir ao carnaval, nem que fosse como no meu tempo.

Mas não posso evitar uma sensação de perda. E a impressão de que estamos abadonando uma grande parte da nossa cultura. Ou talvez fosse mais exato dizer: substituindo-a por outra cultura.

No meu tempo, o carnaval aqui na Bahia era mais uma festa em clubes. A gente ia para a Avenida, durante o dia, apenas para zoar com a galera ou paquerar as meninas; uma espécie de aperitivo, se é que me entendem.

À noite, de banho tomado, vestia a fantasia ou o short e a camiseta e ia para o clube. Aí, é que rolava mesmo; entre cuba-libres ou doses de conhaque (a depender da grana), a gente brincava até o dia raiar, ao som daquelas músicas de antigamente.

E que músicas! Bandeira Branca, Máscara Negra, A Noite é Linda, ou as mais animadas: Corre Corre Lambretinha, Índio quer Apito, Pó de Mico e muitas outras. A verdade é que, animadas ou não, as músicas eram mais lentas do que hoje; dava pra revezar o sambão com uma dança bem agarradinho.

Muitas das letras eram bem românticas; isso também facilitava e era mais fácil a gente se armar. Muitos namoros começavam no carnaval; é bem verdade que tantos outros acabavam, mas isso é outra história. Como naquela famosa música Até Quarta-Feira.

Também na Avenida era diferente. Não havia Trio Elétrico e o som dependia dos blocos, que não desfilavam todos na mesma hora. Assim, quando um bloco passava o povão (que não tinha dinheiro pra clube) aproveitava pra sambar e muitos acompanhavam. Tendo passado o bloco, voltava a quietude, até que o próximo chegasse.

Na verdade, eu vi nascer o Trio Elétrico. Por coincidência, morava perto do lugar onde ele foi criado: uma vila humilde, de casas pequeninas. Ainda me lembro da surpresa, quando vi pela primeira vez na rua aquele carro antigo (se não me engano, um Citroen ou Ford), preto, sem capota, e dentro dele quatro músicos folgazões tocando as suas guitarras; daquela primeira vez, apenas a garotada acompanhou o cortejo.

Hoje, os Trios Elétricos são quase transatlânticos sobre rodas: palcos, camarotes, o escambau. Os artistas mais famosos disputam, para desfilar em cima deles; atrações mundiais, como Bono e até um DJ inglês tocam para o povo dançar. E eu pergunto: onde fica a festa do povo?

Blocos, camarotes, tudo custa uma grana; tanto, que o pagamento é dividido em carnês. A alternativa é pular de pipoca, entre a multidão, sem nenhuma segurança; arriscando a ser roubado ou levar uma porrada a qualquer instante. Eu, que curtia tanto o carnaval, hoje fico apreensivo quando meus filhos vão “brincar”; para mim, não é brincadeira... é guerra, mesmo!


O carnaval do Rio, hoje, é apenas o desfile das escolas de samba; uma festa de elite, que o povão apenas assiste, como um jogo de futebol. O de São Paulo, idem idem na mesma data; O carnaval da Bahia (exagero à parte) é quase como fazer um piquenique no Iraque.

Acabaram as fantasias, as mortalhas, as máscaras; a lança-perfume é droga, sujeita à apreensão. As músicas perderam o romantismo. O nosso carnaval, hoje, é um mero espetáculo folclórico, para o turista ver. Ou para alguns descarregarem a agressividade reprimida no resto do ano.

Acabou o Carnaval. Não há mais espaço, nem romantismo, para Arlequim chorar pelo amor da Colombina...


(Ilustração: Paulinho Couto)